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Capítulo 1 - parte 2 Eliza e Fernando


Parte 2

Enquanto víamos o álbum de dona Cristina, hora ríamos hora nos emocionávamos. Ela contava algumas passagens do dia do casamento, como a forma que o buquê foi dado. As moças solteiras fizeram um círculo de mãos dadas e giravam numa ciranda conforme a música tocava. A noiva ficou no centro com alguém que lhe tapou os olhos. Ela ficou com o braço estendido por um tempo e de repente gritou “pare”. E caminhou ainda com os olhos tapados, parou de frente para uma moça e disse “é essa”. Eu fiquei imaginando a cena, acredito que foi muito divertido.

Era inacreditável, mas duas horas haviam se passado e cada um de nós tomamos três cálices de vinho. Vi que já passava da hora de pararmos.

— Bem – eu comecei a dizer – a hora já foi, dona Cristina já passou da hora da senhora estar na cama, é bom que seu filho não saiba disso ou eu perco meu emprego.

— Esse será nosso segredo, eu adoro segredos – ela disse colocando a mão na perna de Fernando que sorriu calorosamente para ela.

— A Fernando, aguarde Eliza aqui, ela o acompanhará até o portão.

— Não é necessário dona Cristina – disse ele – eu me viro.

— Eu insisto rapaz, ela só vai me ajudar a me arrumar para deitar. Fique à vontade, se quiser beba mais um gole. – Dizendo isso ela piscou para ele e me acompanhou. Ao entrarmos no quarto eu fui já falando sobre aquilo.

— Dona Cristina, que história foi aquela de mandar o Fernando me esperar para leva-lo até o portão. Que eu saiba ele é praticamente da casa. O que a senhora está querendo tramar? – embora eu falasse sério, não deixei de usar um tom de brincadeira.

— Eu acho que ele tem uma queda por você Eliza, veja, ele é um bom partido. Trabalhador, já tem a casa com mobília e tudo. E vi como ele olhava pra você durante o jantar.

— Oh não... Por favor dona Cristina, eu o conheci ontem. Não é possível que isso já esteja acontecendo, além do mais... – eu me sentei na poltrona que tinha ali no quarto da bondosa senhora. – Além do mais, eu não estou preparada para conhecer ele melhor.

— Ah sim, mas não precisa estar. Basta deixar acontecer!

— Ou deixar a senhora fazer acontecer pelo que vi?

— Bem, uma mãozinha não faz mal, não é?

— Vou acompanha-lo até o portão. – Boa noite dona Cristina, se precisar de mim a campainha está bem aqui ao lado do travesseiro.

— Boa noite menina, vá e viva uma história de amor.

Ela fechou os olhos após dizer isso e caiu imediatamente em um sono profundo. Eu olhei para a porta e lembrei do convidado que estaria na sala me esperando, talvez com mais vinho. Bem, melhor acabar logo com isso.

Entrei na sala e ele estava realmente com um cálice na mão e outro sobre a mesinha de centro. Quando ele me viu, foi logo pegando e estendeu em minha direção. Eu peguei e agradeci.

— Obrigada.

— Por nada. Eu tenho muito carinho por ela, são vinte anos morando aqui então nos conhecemos bem.

— Nossa, vinte anos é muito tempo, quase minha idade.

Ele não disse nada e virou o resto do vinho de uma vez. Depois ficou me olhando com as espessas sobrancelhas erguidas.

— É melhor eu ir, e você me acompanhar até o portão. Sabe que amanhã será a primeira coisa que ela irá te perguntar. Vamos então?

Eu fiz um gesto com a mão apontando a porta. Estava uma noite fresca e o céu estava salpicado de estrelas. Parecia um momento romântico, não sei se ele notou que fiquei um pouco acanhada, mas se notou não disse nada.

— Ela fala do falecido marido com grande sentimento, mas é um sentimento bem distante. – Ele comentou e eu imediatamente lembrei do episódio de hoje quando ela falou sobre a morte dele, de ter sido negligente, mas achei melhor não comentar nada com Fernando.

— Você namora Eliza? – Eu não esperava a pergunta e minha reação foi de susto.

— E... eu? Oh não... quero dizer, eu estava namorando – ele me olhou e seu rosto era impassível.

— Estava?

— É eu... Eu estava, terminamos quando eu aceitei esse trabalho. Ele não queria que eu viesse para outra cidade, e me fez escolher entre ele ou o emprego... Pedi demissão do outro emprego para cuidar da minha mãe que – eu parei de falar e me senti meio zonza, acho que pelo vinho e pelo assunto. Eu comecei a chorar, chorava de soluçar. Fernando ficou ali parado apenas esperando eu me acalmar. O que levou alguns minutos até que ele falou algo.

— Você quer falar?

— Estava desempregada, na verdade eu pedi demissão, não tive escolha. Minha mãe estava em fase terminal... ela tinha câncer no pulmão. Eu fiz um bom curso de cuidadora para cuidar dela, até o fim. Desculpe pela falta de controle, ainda é muito recente sabe.

— Sinto muito, meus pêsames. Você tem pai?

— Sim tenho – o choro parou de modo repentino – ele é um amor, tenho dois irmãos também, um mais velho e um mais novo. – Eu parei de falar e fiquei olhando para ele, eu estava com o rosto molhado ainda pelas lágrimas. De repente comecei sentir um calor que não sabia se era do tempo ou do vinho, ou do jeito que ele me olhava.

Então ele ergueu a mão e em um gesto de grande delicadeza passou um dedo numa lágrima estacionada na minha bochecha. Ele se aproximou mais de mim e tocou meus lábios com o dele. Eu não poderia chamar aquilo de beijo.

— Bom, aqui é o portão. Boa noite Eliza, durma bem.

— Boa noite!







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